A sério. O pior que nos aconteceu na vida foi D. Afonso Henriques e a mania da independência. Agora éramos Espanha, tínhamos uma taxa de desemprego lixada (e aqui não?), mas tínhamos mantido a língua e sabíamos falar outra, uma capital monumental, cidades cosmopolitas, artistas importantíssimos, escritores que dão cartas e o 60 Minutos faria reportagens sobre toureiros, que é o que acabo de ver na SIC Notícias. Não se trata do certo ou errado que está a tourada. Não entro nessas discussões. Trata-se de que é uma arte diferente que coloca Espanha no palco mundial. Nós temos o quê? O Bo na Casa Branca. É quase o mesmo, é.
(Ah, e se volto a ouvir um tuga dizer que os espanhóis não sabem falar inglês, traço alguém. Até parece que em Portugal não há quem diga McDónalde, tink em vez de think... complexozinho de inferioridade mais triste!)
Interior. Noite. Café
Ele (conta por que razão está solteiro, procurando lançar charme à companhia) - ...Íamos casar e comprámos casa. Passávamos lá os fins-de-semana, mas acabei com ela porque não arrumava nada, nem lavava a louça.
Ela - Mas de certeza que as coisas já não estavam bem e que isso foi o culminar da situação, não?
Ele - Não, não. Acabei com ela mesmo por causa disso. Além do mais, a minha foi operada às varizes, pedi-lhe para ir lá a casa fazer algumas coisas e ela não foi.
(Isto é uma história verídica e a minha amiga Cristina e eu temos de agradecer a este cromo a pançada de rir que nos deu)
Apenas uma observação: é natural que a maioria dos rapazes já não seja assim, porque caso contrário arriscavam-se a ser completamente irrelevantes na vida das mulheres. Digamos que, se nós nos conseguimos sustentar trabalhando fora de casa, alimentarmo-nos e proteger a nossa caverna (vulgo casa), para que se querem homens neadertais? Para ter filhos? E quando digo para ter filhos é mesmo para ter filhos, porque depois quem trata deles são as mulheres...
...Falemos sobre Helen Wright, directora de um colégio na Grã-Bretanha que voltou ao trabalho sete-horas-sete depois de ter dado à luz a terceira fila.
Ouvi isto contado há umas duas semanas na revista de imprensa internacional nas manhãs da SIC Notícias. Já se sabe que este assunto me enerva por de mais. Dizia-me eu: "Para que quer esta mulher três crianças se nem 24 horas fica com elas?"; "Bonito exemplo dá às suas alunas (têm razão os pais que se indignaram)"; "Isto é o fim do mundo em cuecas"; entre outras reflexões dignas de Zé Manel Taxista (mas com menos graça).
Sorte para mim, a indignação deu-me para ir à procura de mais informação. Encontrei-a aqui e
aqui. E Helen Wright não é uma maluquinha, pelo contrário. Ela leva a criança para o trabalho. Não sei se isto é um bom ou um mau exemplo e francamente não quero saber - ela acha que sim, que esta é uma maneira de mostrar às alunas que se pode trabalhar e ter filhos ao mesmo tempo. Eu não quero saber do exemplo. Mas parece-me que o que ela faz é uma pedrada no charco, uma afirmação política de enorme grandeza: "não me separo da minha cria, mas não abdico do meu trabalho".
Vamos lá ver: entre trabalho e bebés, eu escolherei sempre os segundos. Sempre. Porque bebés são pessoas e o resto é apenas "qualquer coisa", por mais importante que pareça. Por ti, Madalena, e pela tua irmã que vai nascer, eu faria qualquer coisa: matar, roubar, mentir, abdicar de um trabalho... Anything! Mas isso são "escolhas de Sofia". Não acontece. O que acontece todos os dias é ter de fazer balançar as coisas. Decidir a cada minuto: hoje vou ser melhor mãe ou melhor jornalista? E não tem de ser assim. Não devia pelo menos.
Os homens também pensam coisas destas acho eu, mas com as raparigas é pior. Porque começa logo com esta coisa da licença de maternidade, um instrumento com o qual não podia estar mais em desacordo.
Dantes achava muito bem que as mulheres pudessem estar em casa um fartão de meses com os seus filhos, mas só até me terem chamado a atençõa e perceber que isso é uma maneira de perdermos o comboio profissional. Não é só pelos quatro, cinco, seis meses ou um ano que estivemos fora. Isso é uma questão menor. Poderíamos sobreviver a ela e é uma questão de opção na verdade. O (grande) problema é que isto abre um ciclo.
Os bebés habituam-se a estar com as mães, elas é que dão o leite, a sopa, trocam a fralda. Cria-se uma relação que vai muito para além do papel natural de mãe e do dar de mamar (que só eu é que posso fazer). Começa-se com o leite e as fraldas, passa-se para a sopa e para ser a mãe a vestir todos os dias até que os meninos chamam a mãe até para coisas tão básicas como "dá-me um copo de água".
Dir-me-ão: é dividir a licença com o pai. É uma ideia, claro. E parece que na Dinamarca tem tido bons resultados, desde que passaram a dar benifícios fiscais aos pais que fiquem em casa com os filhos. Mas também não é bem isto que desejo!
O que eu gostava mesmo (não sei se é de ser uma rapariga do campo) é que pudessemos ser mais Helen Wright. Que pudéssemos trabalhar mais com eles por perto. Que a presença dos bebés não fosse tão intrusiva nas nossas vidas.
Hoje parece que as crianças estão sempre a mais. Mas tirando o cinema, teatro, discotecas e concertos, não vejo muito mais sítios onde os miúdos não devessem ser mais bem-vindos. E não são. E, temo, isto nunca vai mudar.
Conseguimos:
- votar
- conduzir
- fumar
- ir à escola
- frequentar a universidade
- controlar quando temos filhos
(Ainda) Não conseguimos:
- receber tanto como os homens
- ocupar tantos (ou mais) lugares de chefia
- deixar de ser "as protegidas de..." na política
- que nos deixem de tratar com um desdenhoso "minha senhora" nas conferências de imprensa
- fazer entender a certos burgessos que não se tratam empregadas de mesa como "amorzinho"
- dividir a licença de parentalidade (e é por isso que ela se chama "de maternidade")
- partilhar democraticamente as tarefas domésticas
Estou a esquecer-me de alguma coisa?
Eu percebo aquelas raparigas da blogosfera que não têm paciência para estaminés de mamãs a falarem da filharada, nem mães em geral que falam de filhos. A sério que percebo. Também ando farta de tipas solteiras a mandarem posts de pescada sobre quão más são as relações de todas as amigas, sobre como têm a auto-estima sempre bem polidinha, sobre como estão sozinhas por opção. Right!!! Especialmente esta última parte. É que se está mesmo a ver que é por isso. Mesmo, mesmo. (Ai, ai, tem pai que é cego!)
Da próxima vez que ouvir algum português a gozar, armado em bom, a dizer que os espanhóis são uns parolos que traduzem tudo, vou mandar-lhes à cara isto:
Como é que os portugueses chamam à 'Lazy Town'?
- Vila Moleza.
Como é que os espanhóis chamam à 'Lazy Town'?
- Lazy Town.
Hoje faz 20 anos que o Muro de Berlim caiu.
Mazeltov!
(Estou a ignorar a Maitê Proença)
Blogues que os pais visitam
Sítios para bebés... e não só